sexta-feira, 5 de abril de 2013

Governo do Justo


Conflitos entre interesses discordantes não são uma novidade na história humana. É da nossa natureza nos apegarmos a alguma causa, uma causa que corresponde à nossa visão de mundo de uma maneira geral. Uma vez agarrados a esta causa, torna-se quase que uma missão desacreditar qualquer um que se apegue a uma causa imediatamente contrária e oposta à causa que você segue. É então que saímos do campo das idéias e passamos ao campo da militância.
O caso mais recente parece ser também o caso que mexeu mais profundamente com a opinião pública, que é a indignação de muitas pessoas contra o atual presidente da Comissão de Direitos Humanos, o deputado e também pastor Marco Feliciano, pelas suas declarações polêmicas. Algumas delas, supostamente seriam homofóbicas e racistas.
A ascensão de Feliciano a este nível de poder levantou muitas questões e mesmo no meio evangélico, onde teoricamente o deputado pastor deveria receber total apoio, as opiniões sobre tais questões estão divididas. A principal delas não é nada nova: “A igreja e o Estado podem se misturar?”
É com foco nisso que eu gostaria de convidá-lo a meditar sobre o versículo a seguir:

Quando os justos governam, alegra-se o povo; mas quando o ímpio domina, o povo geme.
(Provérbios 29:2)

Este versículo tem sido uma das principais chaves usadas por aqueles que defendem que cristãos devem buscar obter posições de liderança, principalmente sobre as estruturas seculares, afinal, o mundo jaz no maligno e portanto, um homem de princípios deve ser o mais qualificado, a fim de amenizar a falta ou a inversão de princípios que hoje governa sobre a sociedade.
Realmente, não é difícil de imaginar que uma pessoa de bom caráter, quando estabelecida em poder de governo, alegrará muito mais ao povo do que uma pessoa de mau caráter. Não precisa ser cristão para acompanhar tal raciocínio.
Porém, é necessário resgatar o poder das palavras, o que só é possível através da valorização de seu verdadeiro significado e sua posição dentro de um contexto. Sendo assim, vamos iniciar resgatando a palavra “cristão”. Cristão é todo aquele que professa o cristianismo como religião ou estilo de vida. Em outras palavras, cristão é todo aquele que diz que crê em Jesus Cristo como Senhor.
O interessante de se analisar desta forma é que o próprio Jesus sabia que haveria um dia em que o mundo estaria cheio de cristãos. Ele sabia também que muitos cristãos não seriam justos e advertiu seus discípulos quanto a isso:

“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.
Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? E em teu nome não expulsamos demônios? E em teu nome não fizemos muitas maravilhas?
E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade.
(Mateus 7:21-23)

Portanto, de acordo com a advertência do próprio Jesus, colocar uma pessoa cristã no poder não é necessariamente fazer com que o justo governe como diz Provérbios 29:2. Sendo assim, quem é que pode ser esse justo, mencionado em  Provérbios? Para responder a esta pergunta, vamos também resgatar o significado da palavra “justo”.  Justo é aquele que age de forma íntegra, imparcial, reta. O justo é uma pessoa incapaz de ser influenciada em seus julgamentos e em suas atitudes. Ele não se contamina, não se corrompe, não é tendencioso. Quem na Terra é assim? O apóstolo Paulo é quem nos responde:

“Como está escrito: Não há um justo, nem um sequer.
Não há ninguém que entenda; Não há ninguém que busque a Deus.
Todos se extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só.
(Romanos 3:10-12)

Não há ninguém, absolutamente ninguém que seja justo! Absolutamente todo ser humano, por melhor que seja o seu caráter, é corrompido pela sua natureza pecaminosa e sempre irá pender para o mal; o mal do seu egoísmo, dos seus interesses ou simplesmente da falta de amor pelo próximo, por Deus ou por si mesmo.
Mas será que isso prova que não há esperança? Se o povo só se alegra quando o governo do justo se estabelece, mas não há justo, o nosso destino é gemer para sempre sob o governo dos ímpios? Isso seria uma verdade, se Deus não se importasse tanto conosco. Felizmente, o próprio Jesus nos revela quem é o justo que poderá governar sobre nós:

“E perguntou-lhe um certo príncipe, dizendo: Bom Mestre, que hei de fazer para herdar a vida eterna?
Jesus lhe disse: Por que me chamas bom? Ninguém há bom, senão um, que é Deus.
(Lucas 18:18-19, com relatos paralelos em Mateus 19:16-17 e Marcos 10:17-18)

“Do aumento deste principado e da paz não haverá fim, sobre o trono de Davi e no seu reino, para o firmar e o fortificar com juízo e com justiça, desde agora e para sempre; o zelo do SENHOR dos Exércitos fará isto.
(Isaías 9:7)

Dizei entre os gentios que o SENHOR reina. O mundo também se firmará para que se não abale; julgará os povos com retidão.
(Salmos 96:10)

É nessa hora que muitos não entendem: em uma democracia, fundamentada em um estado laico, como faremos para que o próprio Deus governe? Aí é que está o grande segredo, escondido cuidadosamente nas palavras de Jesus:

Mas Jesus, chamando-os a si, disse-lhes: Sabeis que os que julgam ser príncipes dos gentios, deles se assenhoreiam, e os seus grandes usam de autoridade sobre elas;
Mas entre vós não será assim; antes, qualquer que entre vós quiser ser grande, será vosso serviçal;
E qualquer que dentre vós quiser ser o primeiro, será servo de todos.
Porque o Filho do homem também não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos.
(Marcos 10:42-45)

O Governo do Justo não se estabelece nos palácios, câmaras e senados, mas sim no povo, especialmente quando se trata de uma democracia. A cultura de um governo está diretamente ligada à cultura do seu povo. No Brasil, por exemplo, não é preciso ser um cristão, nem mesmo um sociólogo para perceber que a corrupção e a má administração públicas acontecem, em grande parte, por conta do desinteresse e até alienação do povo na política.
Agora, imagine um povo que, em lugar de cultuar a imoralidade sexual, a desonestidade e as celebridades, cultuam ao Deus de paz, justiça e amor! Imagine um povo que vai às urnas consciente de que o lugar onde vivem lhes foi confiado por Deus e que, por isso, devem fazer o seu melhor para cuidar bem dele! Imagine um povo que vigia os próprios princípios.
O verdadeiro Governo do Justo começa pelo evangelismo que seja puro e baseado em amor, não em interesses.

Parando para analisar assim, nós, como igreja, se desejamos estabelecer o único governo que pode ser justo, precisamos direcionar menos foco nos cristãos que ocupam os lugares altos e mais foco na nossa participação no evangelho, no único reino que, uma vez estabelecido, jamais passará.
Não creio que seja errado que um cristão se interesse em ingressar na carreira política, desde que ele tenha a consciência de que, enquanto político ele está executando um trabalho, assim como o pedreiro, o advogado ou o médico; observando princípios como o que está descrito em Efésios 6:

Vós, servos, obedecei a vossos senhores segundo a carne, com temor e tremor, na sinceridade de vosso coração, como a Cristo;
Não servindo à vista, como para agradar aos homens, mas como servos de Cristo, fazendo de coração a vontade de Deus;
Servindo de boa vontade como ao Senhor, e não como aos homens.
(Efésios 6:5-7)

Eu poderia ser pastor na minha igreja; se eu trabalhasse com vendas, no momento que eu colocasse o pé na empresa, eu seria vendedor.
Enfim, um grande erro do Feliciano e de tantos pastores políticos como ele, foi não saber separar devidamente suas funções. Quanto a nós, que somos crentes mas temos um dever cívico, devemos vigiar para que saibamos a hora de simplesmente sermos cidadãos.

Um comentário:

  1. O que tem me envergonhado é a ignorância e a cegueira do povo, principalmente dos cristãos. Ultimamente muitos casos vem chamando atenção e em todos eles os Pastores não tem conseguido separar a vida particular, profissão e seu cargo de pastor.
    Sem rodeios, nós somos todos leitores e conhecedores da palavra, (as vezes, ja) cansados de ouvir e pregar... Sabemos que somos perseguidos por muito pouco, tentados por quem menos esperamos e por saber disso deveriamos estar sempre preparados para responder a quaisquer questionamentos... Usando o que aprendemos, estar revestidos da armadura de Deus, para termos discernimento, sabedoria, mansidão, dominio próprio etc... E em todos os casos q temos visto, nenhum deles estava preparado para enfrentar o "mundo". A colheita dessa plantação vemos pela repercussão da mídia. Não quero nem entrar na questão de que os últimos escandalos foram por preconceito e q alem de tudo tem muito cristão ainda achando q a revolta do povo do mundo deve ser combatida a altura, mas esquecem que a palavra proferida q feriu o povo foi de um representante evangélico, q na minha opinião totalmente sem tato para lidar com questões tão delicadas... Está faltando amor no coração desse povo... Eles crêem que estão salvos, mas esquecem de levar a salvação pra quem ainda não conhece Jesus. Aqueles que conhecem a verdade deveriam conhecer a Jesus e ao menos tentar fazer o q nosso Senhor nos deu de graça!

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